IRREGULARIDADES

Laboratório envolvido em infecções por HIV terá licitação investigada pelo Ministério Público

Por Augusto de Sousa Publicado em 12/10/2024 às 08:15
Fachada do laboratório Patologia Clínica Doutor Saleme (PCS-Saleme), onde houve as infecções. Reprodução

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ) abriu uma investigação para apurar possíveis irregularidades na contratação do laboratório Patologia Clínica Doutor Saleme (PCS-Saleme) pelo governo do estado. A medida foi tomada após o estabelecimento ser responsabilizado por um erro grave em exames que resultou na infecção por HIV de seis pessoas que receberam órgãos transplantados.

A Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ) confirmou que o laboratório foi contratado em dezembro de 2023, por meio de um pregão eletrônico no valor de R$ 11 milhões, para realizar exames de sorologia em órgãos doados. Esta foi a primeira vez que um incidente desse tipo ocorre no serviço de transplantes do estado, que já salvou mais de 16 mil vidas desde 2006.

O laboratório pertence a Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, primo do ex-secretário de Saúde do estado, o deputado federal bolsonarista Doutor Luizinho, líder do PP na Câmara. A ligação familiar e os valores milionários pagos ao PCS-Saleme levantaram suspeitas sobre a regularidade da contratação. Entre 2022 e 2024, o laboratório recebeu R$ 19,6 milhões da Fundação Saúde, empresa pública do estado, responsável pelos contratos de prestação de serviços de saúde.

Doutor Luizinho (de pé), com a mão no ombro de Walter, marido de sua tia; no canto, agachado, está Matheus, o outro sócio da empresa. Foto: reproduçãoOs primeiros pagamentos à PCS ocorreram em agosto de 2022, mesmo sem um contrato formal. O laboratório foi remunerado por meio de termos de ajuste de contas (TACs), uma prática excepcional usada para reconhecer serviços prestados sem contrato, mas que, segundo o Tribunal de Contas do Estado, foi usada de forma indiscriminada. Em 2023, a empresa finalmente assinou um contrato, ainda que sem concorrência, conforme recomendação legal

Em nota, Doutor Luizinho afirmou que conhece o laboratório há mais de 30 anos, mas negou qualquer envolvimento com a contratação do PCS-Saleme durante sua gestão na Secretaria de Saúde.

Ele lamentou profundamente o ocorrido e pediu punição exemplar para os responsáveis pelas infecções. A irmã de Doutor Luizinho, Débora Lúcia Teixeira, ocupa um cargo na Fundação Saúde, mas, segundo a entidade, ela não tem ligação com a área de contratos.

O deputado federal Doutro Luizinho, líder do PP na câmara, fazendo o “22” em alusão ao número de Bolsonaro nas eleições presidenciais. Foto: reproduçãoA gravidade do caso levou o Ministério da Saúde a determinar uma auditoria emergencial no sistema de transplantes do Rio de Janeiro, com o objetivo de investigar as falhas na contratação do laboratório e em outras áreas do processo de transplantes. Além disso, a Polícia Civil, por meio da Delegacia do Consumidor (Decon), também abriu inquérito para apurar os crimes.

O Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj) e a Vigilância Sanitária Estadual interditaram o laboratório, e uma sindicância foi aberta para investigar as irregularidades.

Outro fator alarmante é que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) descobriu que o laboratório não possuía kits necessários para realizar os exames de sangue e não apresentou documentos que comprovassem a compra dos materiais. Isso levantou a suspeita de que os testes podem não ter sido realizados e que os resultados podem ter sido forjados, agravando ainda mais a responsabilidade do laboratório no caso.