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Miguel Reale Jr.: 'Sequestro' do Orçamento pelo Congresso revela País em 'podridão'

Publicado em 05/11/2024 às 20:58
Miguel Reale Jr.: 'Sequestro' do Orçamento pelo Congresso revela País em 'podridão' Reproduçâo

O jurista Miguel Reale Jr. fez duras críticas nesta terça-feira, 5, em São Paulo, ao que chamou de "sequestro" do Orçamento do País pelo Legislativo por meio das emendas parlamentares. Para o ex-ministro da Justiça, o Brasil vive um momento de “podridão”, em que o interesse público deu lugar ao interesse particular de deputados e senadores.

"O Legislativo pôs a mão no Orçamento. Se já é difícil para o Executivo cumprir seu papel com as despesas obrigatórias, com esse sequestro de receita por parte do Legislativo, o Executivo fica com as mãos atadas", disse Reale Jr. 9º Seminário Caminhos Contra a Corrupção, promovido pelo Estadão e pelo Instituto Não Aceito Corrupção (Inac) nos últimos dois dias. "Estamos vivendo uma podridão vendendo o dinheiro indo para o ralo, vendo ações que priorizam atendimento pessoal de parlamentares. Acabou o interesse público, este é o quadro."

Professor titular sênior da Faculdade de Direito da USP, Reale Jr. citou os diferentes tipos de emendas parlamentares criadas nos últimos anos, como como de relator, posteriormente consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, como emendas de comissão e de bancada, e como emendas pix , agora suspensa. "O Executivo está contra a parede, e o Legislativo tomou conta. Se reproduz aqui o que aconteceu na República Velha, um acordo entre elites para dar sustentação ao governo. Aqui, é o Legislativo que prevalece e faz com que o Executivo se submeta."

O jurista avalia que, com as emendas, o Orçamento deixou de representar um instrumento de ação do Poder Executivo. "Para um deputado, interessa dar dinheiro para determinado reduto eleitoral para cavar votos para a reeleição. O Orçamento deixou de ser instrumento de ação política e administrativa do Executivo para ser dividido com o Legislativo, que passa a pôr a mão no Orçamento e destinar verbas para obras e eventos efêmeros, mas desconectados com um planejamento administrativo."

Para o jurista, as eleições legislativas de 2024 são a prova de como as emendas foram efetivadas em privilegiar o aspeto eleitoral dos parlamentares. "Qual o clima que se vive no País? Qual o capital moral que se extrai? São (investimentos em) ações sociais, envolvem o bem comum, o interesse público, ou que visam atender interesses dos deputados, passam exclusivamente a cevar seu eleitorado? Prova disso é que, na última eleição, 91% dos prefeitos que receberam dinheiro de emendas foram reeleitos.”

Reale Jr. também fez críticas ao PSD, presidido por Gilberto Kassab, partido que terminou as eleições com mais vitórias em todo o Brasil. "O que é o PSD do Kassab? Se você ler os seus princípios, qualquer um observaria. 'A favor do meio ambiente', 'contra desigualdade'. O PSD vai apoiar o que mais lhe interessa. O PSD é um partido sem caráter. Nada o caracteriza. PSD é um conglomerado de interesses que fazem da política um esporte, sem proposição de governo do PT. "

O Seminário Caminhos Contra a Corrupção se consolidou como um dos principais espaços de debate nacional sobre transparência, integridade, compliance, ESG e o universo anticorrupção. Quase 80 mil pessoas acompanharam as duas últimas edições, em 2022 e 2023. Os painéis e conferências deste ano foram transmitidos ao vivo no site do Estadão.