Inquérito da PF atribui a corregedor do TCE-MS papel de 'negociador de sentenças'
O corregedor do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul Osmar Domingues Jeronymo, afastado das funções em meio à Operação Ultima Ratio, é apontado pela Polícia Federal como um 'negociador de sentenças' no Tribunal de Justiça do estado - a Corte é o alvo principal da operação que levou ao afastamento de cinco de seus desembargadores sob suspeita de ligação com esquema de venda de sentenças.
O Estadão pediu manifestação do conselheiro, via Tribunal de Contas do Estado. O espaço está aberto.
Jeronymo também foi afastado do TCE, por ordem do ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça. Assim como os desembargadores, ele será monitorado com tornozeleira eletrônica.
A PF rastreou os movimentos do conselheiro de Contas e resgataram diálogos emblemáticos. Seu relacionamento com os magistrados seria muito anterior à chegada ao TCE, desde quando ocupou o cargo de secretário-chefe da Casa Civil em 2014 (Governo André Puccinelli).
O pesquisador achou diálogos de Jeronymo em seu celular. Em certa ocasião, ele comentou sobre o despacho ligado ao afastamento do prefeito de Campo Grande. No plantão judiciário, o magistrado revogou a determinação do juízo de primeira instância, para o retorno do prefeito cassado ao cargo.
"Mas quase foi cara, cê num tem noção do que esses caras fizeram, se eu falar pra você as oferendas, cê num tem noção, é um trem de maluco, tipo que a gente tem assim passado, compromisso, entendeu, não é de um dia só, cê entendeu. ... Conversas antigas, bons whisky's tomados, cê entendeu?", escreveu Osmar Jeronymo ao empresário João Amorim - nome conhecido da Operação Lama Asfáltica - em 2014, indicando pagamento de propinas no tribunal.
O desembargador Vladimir Abreu, que deu o despacho indicado pelo conselheiro na conversa com Amorim, foi o relator de outros processos que agora estão na mira da PF, inclusive na razão da suposta atuação de Osmar Jeronymo.
Uma dessas ações tratou de litígios envolvendo a Fazenda Paulicéia, de 592 hectares, em Maracaju, município com cerca de 50 mil habitantes situados a 160 quilômetros de Campo Grande.
A ação foi movida por Marta de Albuquerque contra Diego Moya Jeronymo - sobrinho do conselheiro -, representada pelo advogado Félix da Cunha, também investigado na Operação Ultima Ratio.
Segundo a PF, o caso envolve acusações de falsificação de escrituras públicas lavradas no Cartório de Registro Civil e Tabelionato de Notas de São Pedro do Paraná, pequeno município paranaense localizado a 600 quilômetros de Curitiba.
O imbróglio é reforçado com relatos de ameaças e ameaças denunciadas por uma parte do processo que teria sido coagida a desistir do pleito referente a uma fazenda. Testemunhas questionadas pela PF confirmaram a violência.
A PF encontrou um diálogo em que Felix ‘deixa claro que a decisão judicial (de Vladimir) está à venda’. Nessa conversa, Felix diz a Danillo Jeronymo, sobrinho de Osmar que trabalhou no Tribunal de Justiça. "Aí é dois preços: um para matar e o outro coiso a gente empurra no Percival (outra parte do processo)."
Analisando o processo da Fazenda Paulicéia, a PF diz que Osmar teria ido, em 2021, até a sede do Tribunal de Justiça para tratar o caso pessoalmente com o desembargador Vladimir Silva. Se fizesse acompanhar de Felix. O encontro foi relatado pelo advogado a Danillo. Nessa conversa, o advogado disse que o desembargador teria antecipado que a decisão seria favorável ao interesse dos investigados.
O inquérito também cita 'fortes acusados de venda de decisão judicial' relacionados à Fazenda Xerez, da qual os investigadores suspeitam que Jeronymo seria um proprietário oculto, junto de seus sobrinhos.
A PF investiga se os sobrinhos do conselheiro, Diego Moya Jeronymo e Danillo, seriam laranjas do tio. Neste caso, a suposta negociação da decisão judicial teria envolvido outro desembargador, Sideni Soncini Pimentel, e também o advogado Felix Jaime.
Até a publicação deste texto, a reportagem do Estadão buscou manifestação dos investigados e do ex-prefeito de Campo Grande, João Amorim, mas sem sucesso. O espaço está aberto (pepita.ortega@estadão.com).