Projeto da anistia: plano bolsonarista conseguirá fazer Motta refém do PL?

Após o recente julgamento do Supremo Tribunal Federal que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) réu por tentativa de golpe de Estado, o projeto de anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é a última cartada de deputados bolsonaristas para tentar um perdão preemptivo.
O texto, que está parado no Congresso, concede anistia a quem participou de manifestações no país a partir de 30 de outubro de 2022, data do segundo turno das eleições presidenciais que reconduziram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao poder.
Apesar dos líderes do Congresso, o presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre, e da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, terem declarado ser pequena a possibilidade de aprovação do projeto nas duas casas, o Partido Liberal (PL), maior sigla da Câmara com 92 parlamentares, está empenhando em desengavetar o projeto e aprová-lo com 300 votos, acima da maioria simples.
Para isso, o partido espera contar com a ajuda de demais partidos do centrão como Progressistas (PP), Republicanos, União Brasil e o Partido Social Democrático (PSD), que já sinalizaram apoio à proposta.
Ainda assim, a matéria depende de sua colocação na pauta, tornando os personagens de Alcolumbre e Motta peças-chave nessas discussões. Para forçar os presidentes legislativos, o PL ameaça obstruir as demais discussões legislativas até que seja ouvido.
Embora o texto use o termo manifestantes, abre brechas para incluir na anistia quem orquestrou os atos que culminaram na invasão das sedes dos três Poderes em janeiro de 2023. Segundo o professor de ciência política da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcus Ianoni, a peça legislativa é uma importante estratégia da oposição que ganhou força após o Supremo Tribunal Federal tornar Bolsonaro réu no processo.
O STF já responsabilizou cerca de 900 pessoas pelos atos antidemocráticos cometidos na ocasião. Desse total, 371 foram condenadas por crimes como tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, associação criminosa e deterioração de patrimônio público, cujas penas variam entre 3 anos e mais de 17 anos de prisão.
À publicação, no entanto, Ianoni destaca que dificilmente o PL conseguirá sequestrar a pauta legislativa a seu favor. "Motta foi eleito por uma ampla coalizão de partidos, inclusive o PT, que reuniu 489 deputados. Em sua votação recebeu 444 votos."
"O PL representa apenas 21% desses votos recebidos por Motta. Eu ficaria surpreso se Motta se tornasse refém do PL."
Além disso, argumenta o professor da UFF, essa movimentação pode se revelar um tiro no próprio pé do PL. Com uma manifestação esvaziada em Copacabana, fato admitido pelo próprio Jair Bolsonaro, evidenciou-se que a pauta da anistia não é tão popular entre sua base.
"O Congresso precisa votar matérias importantes, como a isenção do Imposto de Renda, o tema dos supersalários e a regulamentação da reforma tributária", lembra Ianoni. "Até que ponto os eleitores vão dar mais importância a boicote ao Legislativo do que aos projetos que interessam ao país?"
Diferente de 2015 e 2016, quando o MDB (na época PMDB) surfou uma enorme maré antipetista para emplacar pautas espinhosas ao governo na Câmara, "Hoje a pressão do PL não é contra o governo, mas sim contra o STF", destaca o professor. "E embora seja significativa, não tem a magnitude que teve naquele período."
Por Sputinik Brasil