DEFESA

Análise: chegou a hora de o Brasil pensar em um programa robusto de mísseis?

O lançamento do Oreshnik mandou um claro recado dissuasório para os países ocidentais. O Brasil, por sua vez, tem como base da defesa nacional uma estratégia que leva em consideração a assimetria tecnológica com o inimigo.

Publicado em 13/12/2024 às 16:55
© Marinha do Brasil/Divulgação

Analistas ouvidos pela Sputnik Brasil acreditam que o Brasil deve se concentrar em fortalecer sua base industrial de defesa, mas o país precisa superar um grande problema: a falta de continuidade em projetos.

Segundo o comandante Robinson Farinazzo, especialista militar e oficial da reserva da Marinha do Brasil, vários projetos militares já morreram no meio do caminho, inclusive a Avibras, que "tem 60 anos e a gente está deixando morrer".

"Se a gente tivesse dado continuidade a essa família de mísseis que a gente tinha aí nos anos 1970, onde a gente estaria hoje? Mas não, os projetos morreram e começa tudo do zero. Por que a Rússia tem uma indústria de blindados poderosos e eficientes? Porque eles estão fabricando blindados desde os anos 1930", analisa.

Em relação ao questionamento inicial, sobre o Brasil investir em um programa forte de mísseis, o especialista sinaliza positivamente, avaliando essa ser a melhor alternativa "em termos de custo, benefício, versatilidade, flexibilidade e poder dissuasório".

O grande desafio, conforme Farinazzo, seria a elite política e econômica brasileira entender que o Brasil carece de poder dissuasório e que tais projetos seriam de suma importância no âmbito geopolítico e econômico.

"O Brasil quer fazer parte do Conselho de Segurança da ONU como membro permanente, quer que amplie o Conselho de Segurança e fazer parte dele. Mas como? Se a gente não tem na verdade ficha pra colocar na mesa, que são forças armadas poderosas", diz, acrescentando que sem uma soberania tecnológica em defesa, "você não é uma voz ouvida no mundo".

'Brasil precisa entender quais são suas vulnerabilidades'

Para José Augusto Zague, pesquisador do Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas e do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional da Universidade Estadual Paulista (Gedes/Unesp), países que buscam autonomia estratégica tem que ter uma definição clara de suas necessidades para supri-las.

No caso, o analista define o Brasil como um país que ainda não entendeu as suas vulnerabilidades, logo uma indústria de defesa brasileira não surgiu a partir desse cálculo.

"Para saber quais são as vulnerabilidades de um país, é necessário que isso esteja em um plano nacional de defesa ou na estratégia nacional de defesa", comenta o analista.

De acordo com Zague, o Brasil, no âmbito da indústria global de defesa, está inserido naquilo que ele chama de "modelo da tecnologia militar globalizada", no qual "todas as indústrias de defesa brasileira têm algum tipo de dependência relacionada a esse modelo, que é um modelo liderado pelos Estados Unidos, que tem também os países da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte]".

"O Brasil tem pouquíssima participação como fornecedor de algum tipo de componente ou parte, isso reflete [...] a falta de vocação", acrescenta.

Diferentemente da Rússia, cujo modelo está fora desse modelo "da tecnologia militar globalizada; os russos procuraram ter autonomia estratégica, produzem praticamente tudo aquilo que eles precisam". A China também segue o mesmo o caminho.

Diante desse contexto, o analista define que o Brasil enfrenta problemas desde definições em relação às suas ameaças, como balizar a sua defesa e, no âmbito dos mísseis, pode até esbarrar em acordos internacionais.

O Brasil é, desde 1995, signatário do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis, definido como uma associação informal criada como esforço multilateral para o combate à proliferação de mísseis e outros sistemas capazes de lançar armas de destruição em massa (ADM), sejam químicas, biológicas ou nucleares.

Entretanto, o mais determinante para o Brasil é "acabar com essa disfuncionalidade da sua base industrial de defesa, pensando em uma vocação que possa fazer com que o Brasil responda às suas necessidades".

Por Sputinik Brasil