Capital privado não 'está à altura' de sanar Avibras e Estado tem que agir rápido, diz analista
Em meio a uma recuperação judicial, a Avibras Indústria Aeroespacial está passando por um momento um tanto delicado. Só nos últimos 19 meses, a empresa não tem conseguido honrar os holerites.
Contudo, segundo especialista ouvido pela Sputnik Brasil, embora haja interesse privado em manter o funcionamento da empresa bélica, o resultado não é tão fácil quanto parece.
"Não acredito que o capital privado brasileiro esteja à altura da tarefa de sanear todos os problemas da Avibras e recolocá-la como uma empresa competitiva e estratégica. A empresa é de suma importância para a defesa do Brasil. Ela é um grande laboratório, ela produziu grandes experiências ao longo desses últimos 50 anos e ela precisa de uma atenção estatal", criticou o professor de história e pesquisador do Núcleo de Estudos das Américas (Nucleas), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), João Cláudio Pitillo.
Os funcionários da Avibras se reuniram com o Sindicatos dos Metalúrgicos de São José dos Campos, em São Paulo, na última quinta-feira (21), para discutir a proposta apresentada pelo investidor brasileiro, cujo nome ainda não foi revelado.
O grande impasse é a situação dos trabalhadores que estão há 19 meses sem receber salários e em greve desde setembro de 2022, por conta da crise financeira da empresa. A reunião no sindicato não teve um acordo entre as partes.
Sobre a problemática, o historiador acredita que uma "parceria público-privada com o controle majoritário do Estado brasileiro" resolveria maior parte da situação, sem deixar o poder público de lado.
Afinal, em suas palavras, a Avibras, "mesmo vendendo para outros países e exportando bastante, ela é uma empresa estratégica para o Brasil".
Papel importante na indústria bélica
Para Pitillo, não há capital privado suficiente que sane os problemas financeiros, principalmente a dívida trabalhista com os funcionários, que é muito grande, e segundo, transformar ela de novo numa empresa competitiva e de ponta e que trabalhe para a defesa nacional.
"Sem a presença do Estado, é muito temerário esse tipo de coisa [acordo e participação privada]", arrematou.
As plataformas de foguetes Astros 1 e 2, que abastecem o Exército Brasileiro, por exemplo, estavam em desenvolvimento com a potência bélica brasileira. Mas, segundo o historiador, o projeto mais impactante é o míssil de cruzeiro.
"O Exército Brasileiro estava negociando um míssil tático de cruzeiro que tivesse alcance de 300 km, e isso está praticamente paralisado. Avibras tinha outros projetos muito importantes e tinha um corpo técnico de expertise gigantesco. [...] temos que observar que projetos importantes estão parados, uma produção importante está parada e o que é pior, essa fuga dos cérebros desse corpo técnico da Avibras, vai impedir que ela crie novos projetos", criticou à Sputnik.
Avibras: a situação da empresa
Dois anos após ter problemas financeiros e protocolar sua recuperação judicial, em 2022, em julho deste ano foi finalmente aprovado o plano de restabelecimento da Avibras e, com isso, se iniciaram as conversas de venda da companhia de João Brasil.
A princípio, considerou-se a venda para a australiana DefendTex. A companhia, de menor porte e que teria muito a ganhar com a compra, estuda comprar mais de 50% das participações na empresa brasileira.
Outra cotada para adquirir a Avibras foi a chinesa Norinco, que queria adquirir 49% das ações. A venda, contudo, encontrou resistência em Brasília e sofreu críticas até mesmo por parte dos Estados Unidos, que alertaram que poderiam embargar a venda de componentes caso a Avibras fosse controlada pela estatal chinesa.
Fundada pelo engenheiro do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) João Verdi Carvalho Leite, popularmente conhecido como João Brasil, e seus colegas, a Avibras é uma importante companhia de defesa brasileira. É responsável pela criação do lançador de foguetes Astros, a joia da coroa da empresa e um dos melhores do mundo, capaz de alcançar alvos entre 10 km e 300 km com alta precisão e letalidade.
Seu desenvolvimento soberano é motivo de orgulho para as Forças Armadas, o Ministério da Defesa e toda a Base Industrial de Defesa (BID).
O lançador é, inclusive, protagonista do Programa Estratégico Astros 2020 do Exército Brasileiro, que visa dotar a força terrestre de dezenas desses lançadores. Iniciado em 2012, espera-se que o processo de fabricação e aquisição se encerre em 2031.
Posicionamento da Avibras
Questionada pela Sputnik Brasil sobre os projetos interrompidos e as dívidas trabalhistas pendentes, a Avibras disse que "prossegue em negociação com investidor brasileiro com o objetivo de garantir a sua recuperação financeira de forma sustentável e retomar as atividades o mais breve possível. Mais informações serão divulgadas em momento oportuno".
Por Sputinik Brasil