Senadores divergem sobre PL da dosimetria
O PL da Dosimetria foi aprovado pelo Plenário do Senado, nesta quarta-feira (17), depois de muita discussão. O PL 2.162/2023, que agora segue para a sanção presidencial, reduz as penas dos condenados por envolvimento nos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro. Enquanto os defensores da redução de penas diziam que o projeto é uma forma de fazer justiça aos condenados, os críticos afirmavam que a matéria enfraquece a defesa da democracia. Do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), a matéria foi relatada pelo senador Esperidião Amin (PP-SC).
— Esta vitória não é pessoal de ninguém. Esta vitória é do bom senso e da busca da paz. É um passo nessa direção — afirmou Amin, após a aprovação do projeto.
Democracia
De acordo com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), o projeto de redução de penas pode ser classificado como “infame”. Ele relembrou vários momentos históricos em que o Brasil sofreu tentativas de golpe contra a democracia e disse que os que lutaram contra a ditadura “ainda estão aqui”.
Segundo Renan, todos os direitos dos condenados pelo 8 de janeiro foram respeitados. Ele disse que tentativas legislativas de anistia ou da “PEC da Blindagem” são fruto da impunidade em outros casos de golpe. O senador ainda ressaltou que a anistia e o PL da dosimetria não são pautas da sociedade e elencou atos criminosos contra a democracia cometidos por bolsonaristas.
— Apesar do legado maldito da ditadura, eles tentaram de novo no 8 de janeiro. Agora, os responsáveis começam a pagar. O que pacifica o país é golpista cumprir pena. A anistia para golpistas atrofia a democracia, pune a sociedade que obedece a lei e estimula novas tentativas de sequestrar o estado — argumentou Renan.
O senador Marcelo Castro (MDB-PI) apontou que o maior crime que um homem público pode cometer é atentar contra a democracia, contra o Estado democrático de direito e contra os direitos humanos. Ele disse que a democracia brasileira tem convivido com várias tentativas de golpes. Assim, argumentou o senador, a redução de penas para golpistas não deveria prosperar.
— Recentemente, foi urdida uma trama e planejado um golpe de estado. Isso é gravíssimo. Houve até um plano para assassinar o presidente e o vice-presidente eleitos e o ministro Alexandre de Moraes. Aliviar para golpistas? Aliviar para quem atentou contra a democracia? Jamais! — declarou o senador.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), definiu o projeto como uma afronta à democracia. Ele disse que a situação de agora é incomparável com a anistia de 1979. Segundo o líder, no final da década de 1970, a anistia foi para quem estava lutando a favor da democracia — o que seria exatamente o contrário do que ocorreu em 2023.
Na visão da senadora Teresa Leitão (PT-PE), a oposição “mistura os assuntos” para tentar esconder a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023. Ao pedir a rejeição do projeto, ela disse que os réus foram julgados dentro do processo legal, com todos os direitos respeitados. Teresa afirmou que a rejeição do projeto é uma forma de proteger o Congresso Nacional e a democracia.
— Temos a oportunidade histórica de rejeitar esse projeto e deixar a adolescente democracia brasileira avançar — declarou.
De acordo com o líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (PT-PE), o 8 de janeiro foi o resultado de uma conspiração para apoiar a ruptura democrática. O senador afirmou que as punições aos golpistas precisam ser mantidas para que o estado democrático de direito seja preservado. Os senadores Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) e Rogério Carvalho (PT-SE) também se manifestaram contra o projeto.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) se disse envergonhado do projeto, pois trata-se de uma norma com destinatários claros: o ex-presidente Bolsonaro e seu círculo de auxiliares mais próximos, todos condenados pelo STF por envolvimento com os atos golpistas. Ele lembrou que a Polícia Federal encontrou até minuta do decreto do golpe e identificou um plano para assassinatos.
— Estamos aqui legislando com endereço certo: o ex-presidente Bolsonaro e sua claque. Quando quer legislar de forma contundente, essa Casa o faz contra pobres e pretos. Perdoem meu desabafo. Estou envergonhado e quero pedir perdão à população brasileira pelo que o Senado está fazendo hoje — declarou Contarato, ao pedir a rejeição do projeto.
O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) afirmou que o acatamento de uma emenda de redação na CCJ foi uma manobra regimental, para que o projeto não voltasse para a Câmara. No mesmo sentido, o senador Humberto Costa (PT-PE) disse que a emenda do senador Sergio Moro (União-PR), acatada pelo relator, não deveria ser considerada de redação, mas de mérito.
— Ao derrotar esse projeto, o Senado se mostra como o defensor da democracia e da Constituição — declarou Humberto.
Justiça
O líder da oposição, senador Rogério Marinho (PL-RN), afirmou que o projeto tem a ver “com a nossa própria brasilidade”. Segundo o senador, o projeto pode ser uma forma de fazer justiça e virar a página. Ele disse que toda a “balbúrdia” do 8 de janeiro não foi uma tentativa de golpe, mas uma desculpa para “tirar da vida pública o maior líder político da história recente do Brasil, que é Jair Bolsonaro”.
— Nós temos um desafio pela frente, que é restabelecer as prerrogativas dos Poderes. Precisamos nos dar ao respeito. Vamos deixar o ódio e a revanche de lado e focar no que interessa ao povo brasileiro — pediu Marinho.
Segundo o senador Magno Malta (PL-ES), o que é tido por tentativa de golpe foi, na verdade, uma “arapuca que foi montada por um consórcio infame de perversos formado por STF e Executivo”. Ao defender o projeto, ele disse que as pessoas chamadas de golpistas estavam armadas apenas “com terços, bíblias e algodão doce”. O golpe, acrescentou, só teria nascido “na cabeça doente da esquerda do Brasil”.
De acordo com o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), “houve excessos de várias formas” no 8 de janeiro, inclusive da Justiça. Ao apoiar a redução de penas, ele disse que o perdão é uma tradição política na história do país.
Os senadores Carlos Portinho (PL-RJ), Alan Rick (Republicanos-AC), Jayme Campos (União-MT), Efraim Filho (União-PB) e Izalci Lucas (PL-DF) também se manifestaram a favor do projeto. Já a senadora Tereza Cristina (PP-MS) reconheceu que houve crimes no 8 de janeiro, mas afirmou que as penas impostas pelo STF são desproporcionais.
— Iremos reparar injustiças graves cometidas contra pessoas que receberam penas abusivas — argumentou a senadora.
Anistia
Para o senador Marcos Rogério (PL-RO), o projeto é uma forma de levar um pouco de alento para muitos brasileiros que sofreram com a prisão e com a separação da família desde janeiro de 2023. Ele registrou que preferia votar a anistia, mas admitiu que a redução de pena é o ganho possível para o momento.
Na mesma linha, o senador Marcio Bittar (PL-AC) disse que não houve tentativa de golpe de estado. Ele afirmou que o ideal seria a anistia, mas definiu o projeto como “um degrau a mais” e uma possibilidade dentro do pragmatismo. O senador Sergio Moro (União-PR) também se disse a favor da anistia, mas apontou que a redução da pena já ajudaria a retirar da cadeia os manifestantes que foram apenados de forma excessiva.
Acordo
Na CCJ, mais cedo, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse temer a sinalização que o projeto está passando para a sociedade. Ele afirmou que fez um acordo de procedimento para a votação da matéria, mas fez questão de deixar claro que é contra a redução de penas.
No Plenário, ele disse repelir a tentativa de imputar ao governo a responsabilidade por uma suposta negociação para viabilizar a votação do projeto. Segundo Jaques Wagner, ele apenas pediu prioridade para a votação do PLP 128/2025, que reduz benefícios fiscais. A matéria deve ser votada ainda nesta quarta-feira no Plenário.
— Se muitos aqui são defensores da democracia, não são mais do que eu. O que foi feito é o que se faz normalmente no Congresso Nacional: a negociação entre quem pensa diferente. Respeito a todos e quero respeito também — afirmou o senador.
Na opinião do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), alguns discursos no Parlamento parecem desconectados da realidade do povo brasileiro. Ele criticou a rapidez com que a matéria foi votada na Câmara e no Senado. Segundo Alessandro, o ministro Alexandre Moraes, relator dos processos contra os golpistas no STF, é publicamente contrário ao projeto, mas fez sugestões ao texto que tramita no Congresso. Ele disse que é preciso transparência para fazer acordos, fez ressalvas ao texto, mas votou favorável ao projeto.
O senador Renan Calheiros afirmou que sua geração política não permite acordo com quem tenta golpe contra a democracia. Ele criticou quem não guarda coerência de posição histórica contra os golpes.
Renan relatou que Jaques Wagner o chamou para uma reunião particular, pela manhã, e contou sobre um acordo para votar o projeto da dosimetria e também o projeto que reduz benefícios fiscais. Renan disse que recusou e continua recusando qualquer acordo para votar o PL da Dosimetria.
— Eu nunca vi, em uma questão como essa, alguém do governo fazer um acordo e dar um peru de Natal a golpistas. Eu confesso: hoje foi um dia muito difícil para mim — declarou.
Em entrevista coletiva à imprensa, o líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues, negou que tenha existido algum acordo para a aprovação do PL da Dosimetria em troca de pautas econômicas. Para Randolfe, o projeto é fadado ao veto.
— É um projeto lamentável, que nasceu errado, pois é uma espécie de “anistia Nutella” — afirmou.
A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) também negou a existência de um acordo entre governo e oposição para aprovação de matérias. De acordo com Damares, o projeto é uma resposta do Senado para a sociedade.
— Nós não nos omitimos e não estamos sendo covardes — registrou Damares.