Missa ao papa Francisco reúne milhares no Vaticano: 'Devemos acolher o seu legado', diz cardeal

Um dia após o sepultamento do Papa Francisco, uma missa em sufrágio ao pontífice foi realizada na manhã deste domingo, 27, no Vaticano. A celebração reuniu milhares de pessoas na Praça São Pedro, assim como houve grande movimentação na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, onde teve uma visitação ao túmulo de Francisco.
Na missa, o líder católico foi chamado de "o pastor que o Senhor deu ao povo" pelo cardeal Pietro Parolin - secretário de Estado do Vaticano e próximo de Francisco. De acordo com o Vatican News (portal oficial da Santa Sé), a celebração reuniu funcionários do Vaticano e religiosos, além de adolescentes católicos de diversas partes do mundo e outras milhares de fiéis.
Uma grande quantidade de jovens presentes se deverá à canonização que ocorreria neste domingo, de Carlos Acutis - jovem que morreu aos 15 anos, em 2006, e está prestes a se tornar o primeiro "santo millennial" ou "santo da internet". Contudo, a cerimônia foi adiada após a morte de Francisco, e será remarcada para depois do conclave.
Na missa, o cardeal falou do luto e da importância de manter o legado do papa. “O nosso carinho por ele, que se manifesta nestas horas, não deve permanecer uma simples emoção do momento; acolher o seu legado e vencer a vida vivida”, destacou. "Só a misericórdia cura, só a misericórdia criação um mundo novo, extinguindo os focos de desconfiança, ódio e violência: este é o grande ensinamento do papa Francisco."
"Recordamos com carinho o nosso amado papa Francisco. Esta memória está particularmente viva entre os funcionários e fiéis da Cidade do Vaticano, muitos dos quais estão aqui presentes, e a quem gostaria de agradecer pelo serviço que prestam diariamente. A vós, a todos nós, ao mundo inteiro, o papa Francisco envia do céu o seu abraço", declarou o cardeal.
Além disso, Parolin falou de outro valor que marcou o papado de Francisco: "recordou-nos que não pode haver paz sem o reconhecimento do outro, sem a atenção aos mais fracos e, sobretudo, nunca pode haver paz se não aprendermos a perdoar-nos reciprocamente, usando entre nós a mesma misericórdia que Deus tem para com a nossa vida".
Para a missa, as pessoas se aglomeraram em diversas vias do Vaticano. Entre o público também estavam brasileiros, que chegaram a exibir a bandeira do País. O milagre reconhecido pela Igreja que levou à beatificação de Acutis envolvia um jovem brasileiro.
Na missa, o cardeal também destacou outra das marcas do pontífice: a alegria. “Lembrou-nos disso desde a sua eleição e repetiu-o a nós muitas vezes, colocando no centro do seu pontificado a alegria do Evangelho”, destacou. "A alegria pascal, que nos sustenta na hora da provação e da tristeza, hoje é algo que quase se pode tocar nesta praça. É visível sobretudo nos seus rostos", completou.
Este é o segundo dia dos "novendiais", de novos dias seguidos de missas em sufrágio de Francisco, chamado de "Domingo da Misericórdia". A data também está marcada como o segundo domingo de Páscoa, celebrado pela Igreja Católica.
Confira abaixo a íntegra da homilia do cardeal Parolin
"Queridos irmãos e irmãs,
Jesus Ressuscitado aparece aos seus discípulos, enquanto estavam fechados no cenáculo com medo, com as portas fechadas (Jo 20, 19). O seu estado de espírito está perturbado e o seu coração triste, porque o Mestre e Pastor, que tinha acompanhado deixando tudo, foi pregado na cruz. Viveram coisas terríveis e sinto-se órfãos, sozinhos, perdidos, ameaçados e indefesos.
A imagem inicial que o Evangelho nos oferece neste domingo pode representar bem o estado de espírito de todos nós, da Igreja e do mundo inteiro. O Pastor que o Senhor deu ao seu povo, o Papa Francisco, terminou a sua vida terrena e deixou-nos. A dor pela sua partida, a tristeza que nos assalta, a perturbação que sentimos no coração, a sensação de desorientação: estamos a viver tudo isto, como os apóstolos entristecidos pela morte do Senhor.
No entanto, o Evangelho diz-nos que é precisamente nestes momentos de escuridão que o Senhor vem até nós com a luz da ressurreição, para iluminar os nossos corações. O Papa Francisco lembrou-nos disso desde a sua eleição e repetiu-o a nós muitas vezes, colocando no centro do seu pontificado a alegria do Evangelho que - como escrito na Evangelii gaudium - «enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixar salvar por Ele são libertações do pecado, da tristeza, do vazio interior e do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria (n. 1).
A alegria pascal, que nos sustenta na hora da provação e da tristeza, hoje é algo que quase se pode tocar nesta praça; é visível sobretudo nos seus rostos, queridos meninos e adolescentes que vêm de todo o mundo para celebrar o Jubileu. Vocês vêm de muitos lugares: das dioceses da Itália e da Europa, dos Estados Unidos à América Latina, da África à Ásia e dos Emirados Árabes... convosco está aqui realmente presente aqui nesta Praça São Pedro, esta manhã, o mundo inteiro!
A todos vós, dirijo uma saudação especial, que dirijo também aos bispos que vos acompanham, aos sacerdotes, aos catequistas, aos responsáveis dos vossos grupos. Uma saudação especial com o desejo de vos fazer sentir o abraço da Igreja e o carinho do Papa Francisco, que teria desejado encontrar-vos, olhar-vos nos olhos e passar no meio de vós para vós saudar.
Diante dos muitos desafios que estes são chamados a enfrentar - recorde, por exemplo, o da tecnologia e da inteligência artificial, que caracterizam especificamente a nossa época -, nunca esqueçais de alimentar a sua vida com a verdadeira esperança, que tem o rosto de Jesus Cristo, vivo e ressuscitado em sua Igreja. Com Ele, nada será muito grande ou difícil! Com Ele, nunca estareis sozinhos nem abandonados a vós mesmos, nem sequer nos momentos mais sombrios e mais difíceis de vossa vida! Ele vem ao seu encontro ali onde vos encontrais, para vos dar coragem para viver, a coragem para partilhar as vossas experiências, as vossas preocupações, os vossos dons, os vossos sonhos, a coragem para ver no rosto de quem está próximo ou distante um irmão e uma irmã a amar, a quem tende tanto para dar e, ao mesmo tempo, de quem tende tanto para receber, a coragem para vos ajudar a ser generosos, fiéis e responsáveis na vida que vos espera, para vos fazer compreender o que mais importa na vida: o amor que tudo compreende e tudo espera (cf. 1 Cor 13, 7).
Hoje, segundo domingo da Páscoa, Domingo in Albis, celebramos a festa da Divina Misericórdia.
É precisamente a misericórdia do Pai, maior do que os nossos limites e os nossos cálculos, que caracterizou o Magistério do Papa Francisco e a sua intensa atividade apostólica, juntamente com o desejo de a anunciar e compartilhar com todos - o anúncio da boa nova, a evangelização -, que foi o programa do seu pontificado. Ele nos lembrou que «misericórdia é nome próprio de Deus e, portanto, ninguém pode colocar limites ao seu amor misericordioso, com o qual Ele quer levantar-nos e tornar-nos pessoas novas.
É importante, queridos irmãos e irmãs, acolher como um precioso tesouro esta indicação na qual o Papa Francisco tanto insistiu. E - permiti-me dizê-lo - o nosso carinho por ele, que se manifesta nestas horas, não deve permanecer uma simples emoção do momento; Convidamos acolher o seu legado e tornarmos a vida vívida, abrindo-nos à misericórdia de Deus e tornando-nos também misericordiosos uns para com os outros.
A misericórdia leva-nos de novo ao coração da fé. Lembra-nos que não devemos interpretar a nossa relação com Deus e o nosso ser Igreja segunda categorias humanas ou mundanas, porque a boa notícia do Evangelho é, antes de mais nada, a descoberta de sermos amados por um Deus que tem entranhas de misericórdia e ternura por cada um de nós, independentemente dos nossos méritos; lembra-nos, além disso, que a nossa vida é tecida de misericórdia: só podemos levantar-nos após as nossas quedas e olhar para o futuro se tivermos alguém que nos ama sem limites e nos perdoamos. E, por isso, somos chamados a comprometer-nos em viver as nossas relações não já segundos critérios calculistas ou ofuscados pelo egoísmo, mas abrindo-nos ao diálogo com o outro, acolhendo quem encontra no caminho e perdoando as suas fraquezas e os seus erros. Só a misericórdia cura, só a misericórdia cria um mundo novo, extinguindo os focos de desconfiança, ódio e violência: este é o grande ensinamento do Papa Francisco.
Jesus mostra-nos este rosto misericordioso de Deus na sua pregação e nos gestos que realiza; e, como ouvimos, ao apresentar-se no Cenáculo após a ressurreição, oferece o dom da paz e diz: «Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados; aqueles a quem os retiverdes,ficarão retidos (Jo 20, 23). Assim, o Senhor Ressuscitado determinou que os seus discípulos, a sua Igreja, sejam instrumentos de misericórdia para a humanidade, para aqueles que desejam acolher o amor e o perdão de Deus. O Papa Francisco foi testemunha luminosa de uma Igreja que se inclina com ternura perante os feridos e cura com o bálsamo da misericórdia; e recordou-nos que não pode haver paz sem o reconhecimento do outro, sem a atenção aos mais fracos e, sobretudo, nunca pode haver paz se não aprendermos a perdoar-nos reciprocamente, usando entre nós a mesma misericórdia que Deus tem para com a nossa vida.
Irmãos e irmãs, precisamente neste domingo da misericórdia, recordamos com carinho o nosso amado Papa Francisco. Esta memória é particularmente viva entre os funcionários e fiéis da Cidade do Vaticano, muitos dos quais estão aqui presentes, e quem gostaria de agradecer pelo serviço que prestam diariamente. A vós, a todos nós, ao mundo inteiro, o Papa Francisco envia do Céu o seu abraço.
Confiemo-nos à Virgem Maria, a quem ele estava tão devotamente ligado que comprou reservado na Basílica de Santa Maria Maior. Que Ela nos proteja, interceda por nós, vele pela Igreja e sustente o caminho da humanidade na paz e na fraternidade. Assim seja."