Dos gays ao clima, Francisco imprimiu teor social em pontificado
'Dizem que sou comunista, mas só sigo Evangelho', afirmava

Do clima aos direitos LGBT+, dos jovens à violência contra mulheres: Jorge Bergoglio é, sem dúvida, o papa que mais se envolveu em questões sociais, preocupado com a "cultura do descarte" que marginaliza os mais frágeis.
Um engajamento tão forte que, por vezes, o forçou a se defender de acusações com teor político.
"Dizem que sou comunista, mas sigo apenas o Evangelho", afirmou certa vez.
Ele foi o primeiro pontífice da história a abrir as portas do austero Palácio Apostólico a movimentos populares e centros sociais, abraçando sua luta pelos "três Ts" (terra, teto e trabalho).
Já a preocupação ambiental marcou dois documentos centrais de seu pontificado: a encíclica "Laudato Si'" (2015), na qual defende a criação de modelos de desenvolvimento e não predatórios, e a exortação "Laudate Deum" (2023). O termo chave é "ecologia integral", pois, segundo Francisco, os danos ao meio ambiente, provocados sobretudo pelos mais poderosos, recaem sobre os mais vulneráveis.
Por isso, o finado Papa fez apelos repetidos nas COPs, as cúpulas climáticas da ONU. Em Baku, em novembro de 2024, alertou: "Hoje não há tempo para indiferença. Não podemos lavar as mãos, permanecendo distantes. Este é o verdadeiro desafio do nosso século".
A Amazônia também foi tema da exortação "Querida Amazônia" (2020), embora muitos bispos - especialmente na América Latina - a vejam como uma oportunidade perdida para discutir a ordenação de padres casados, diante da escassez de sacerdotes na região.

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A juventude foi outra prioridade de Bergoglio, com a exortação "Christus Vivit" (2019), fruto do Sínodo dedicado ao tema. Já a família esteve no centro da exortação "Amoris Laetitia" (2016), que acolheu realidades antes marginalizadas, como divorciados casados novamente e uniões entre pessoas do mesmo sexo.
Já na reta final de seu pontificado, o argentino se tornou alvo de críticas internas ao autorizar bênçãos a casais homoafetivos, mas não recuou, apesar da ressalva de que isso não poderia ser confundido com o "sacramento do matrimônio".
"Se uma pessoa é gay, busca o senhor e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la? Tais pessoas não podem ser marginalizadas e devem ser integradas à sociedade", disse o Papa durante sua viagem ao Brasil, em 2013.
Quanto às mulheres, Francisco foi incisivo contra a violência de gênero e a discriminação no trabalho, mas desagradou teólogas feministas com a encíclica "Fratelli Tutti" (2020) por citá-las apenas marginalmente, mesmo após a inclusão do termo "sorelle" ("irmãs") na liturgia católica. O texto é dedicado à fraternidade e tece duras críticas ao capitalismo.
Já em sua encíclica mais recente, a "Dilexit nos", Francisco criticou o "consumismo insaciável" e um mercado que "escraviza" os seres humanos e "não se interessa pelo sentido de nossa existência".
"Movemo-nos em sociedades de consumidores em série, preocupados só com o agora e dominados pelos ritmos e ruídos da tecnologia, sem muita paciência para os processos que a interioridade exige. Falta o coração", escreveu.