Esperança, humor e humildade: as palavras do papa Francisco
Líder da Igreja Católica faleceu no Vaticano, aos 88 anos

A linguagem viva e familiar, para encurtar distâncias e estar ao lado do seu povo, a rejeição da abstração em favor de uma concretude que sempre distinguiu as palavras e os gestos.
E, depois, a esperança como valor a ser cultivado e o humor, verdadeiro "fermento da existência e instrumento para enfrentar as dificuldades, até as cruzes, com resiliência".
O papa Francisco, que morreu nesta segunda-feira (21), aos 88 anos, deu aos seus inúmeros livros publicados o mesmo selo de autoridade e espontaneidade de seu pontificado, que começou em 2013 na Praça de São Pedro, no Vaticano, com um simples "boa noite".
A originalidade na interpretação das Sagradas Escrituras (com os comentários, por exemplo, dos Evangelhos), o rigor da fé, a profundidade de reflexões requintadamente teológicas nunca faltaram em seus textos, e, no entanto, Francisco, o primeiro Papa das Américas, nunca deixou de usar a palavra mais simples, a escrita mais agradável - também nas redes sociais - para dar maior força à mensagem cristã, para falar daquela Igreja "pobre para os pobres" e de si mesmo como vigário de Cristo que permanece humilde ao lado dos humildes.
Um exemplo disso é o livro "Spera" ("Espera", em português), a primeira autobiografia publicada por um Papa na história, disponível em 100 países, na qual Bergoglio confia seu testamento moral e espiritual ao mundo, falando da esperança como pedra angular da vida e da ironia no enfrentamento das dificuldades.
O volume não carece de reflexões (e críticas) sobre algumas questões cruciais, incluindo guerra e paz (entre eles os conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio), migrações, crise ambiental, política social, condição da mulher, sexualidade, desenvolvimento tecnológico, futuro da Igreja e das religiões.
O livro, que inicialmente deveria ver a luz somente após sua morte, mas que foi lançado justamente por ocasião do Jubileu, é uma obra de memórias repleta de anedotas, muitas delas particulares e familiares, nas quais emerge o comovente retrato de um líder carismático e determinado, que se posicionou como pastor, guia e fonte de inspiração para leitores do mundo inteiro, não apenas para os cristãos.
A mesma humanidade e grandeza espiritual destas páginas já eram evidentes em "Abre a tua mente ao teu coração", que foi o primeiro livro de Bergoglio após a sua eleição ao papado: aqui, em quatro meditações, o Papa se dirige à mente e ao coração do leitor, guiando-o ao encontro com Jesus, ao mistério da manifestação de Deus no mundo, aos desafios da Igreja do futuro e, finalmente, à dimensão cotidiana da vida de cada um de nós.
Mas ainda há muitos livros nos quais Sua Santidade abordou abertamente algumas das questões mais ardentes da atualidade. Um exemplo é "Vamos voltar a sonhar. O caminho para um futuro melhor", o volume de 2020 resultante de reflexões nascidas no isolamento durante o período da Covid-19: "Para sairmos melhores desta crise, devemos recuperar a consciência de que, como povo, temos um destino comum. A pandemia nos lembra que ninguém pode se salvar sozinho", diz Bergoglio, não poupando duras críticas aos sistemas e ideologias que contribuíram para produzir os desequilíbrios decorrentes da economia globalizada, obcecada pelo lucro, pelo egoísmo e pela indiferença ao próximo e ao meio ambiente.
E novamente, no ensaio de 2022 "Contra a Guerra. A coragem de construir a paz", Francisco volta a rezar pela humanidade e por um diálogo renovado, identificando na sede de poder, nas relações internacionais dominadas pela força militar, na ostentação de arsenais bélicos as motivações profundas que estão por trás de cada guerra.