Indígenas da Fazenda Canto em Palmeira dos Índios abastecem merenda de Igaci, mas continuam excluídos da própria cidade
Comunidade é referência em agricultura familiar, mas enfrenta barreiras para vender seus produtos à Prefeitura de Palmeira dos Índios

Apesar de serem reconhecidos como exemplo de produção agrícola familiar, os indígenas da Fazenda Canto, em Palmeira dos Índios, seguem enfrentando barreiras institucionais para fornecer alimentos à própria cidade. Atualmente, cinco famílias da aldeia são responsáveis por parte do abastecimento da merenda escolar do município vizinho de Igaci, enquanto continuam sem espaço para integrar os programas alimentares da gestão palmeirense.
O caso foi denunciado recentemente por Cássio Júnior, ex-secretário de Cultura, nas redes sociais, após repercussão de falas do presidente da Câmara, Madson Monteiro, que associou, sem provas, a comunidade a supostos desvios de água na zona rural.
“Aqui na Fazenda Canto temos famílias organizadas, com produção legalizada, com projetos apoiados pela CONAB e pelo PAA (Programa de Aquisição de Alimentos). Já vendemos para Igaci, mas ainda não tivemos a porta aberta na nossa própria terra”, afirmou Cássio.
Produção sustentável e ignorada
Localizada na zona rural de Palmeira dos Índios, a comunidade indígena da Fazenda Canto tem se destacado por sua atuação no campo da agricultura sustentável e comunitária. Com projetos voltados para o abastecimento de escolas públicas e inclusão em programas governamentais, as famílias locais representam um modelo de organização e resistência.
O PAA, por exemplo, é um dos principais instrumentos federais de estímulo à produção local, ao permitir que agricultores familiares forneçam diretamente para creches, escolas e outras instituições públicas. O município de Igaci, distante 15 km de Palmeira, é um dos que já integram esses fornecedores da Fazenda Canto, numa parceria que valoriza a produção indígena e reforça a alimentação escolar com produtos frescos e saudáveis.
Portas fechadas em Palmeira dos Índios
A contradição, segundo lideranças indígenas e apoiadores da comunidade, é que, mesmo estando dentro do território de Palmeira, os agricultores da Fazenda Canto não conseguem acesso aos mesmos programas municipais. Falta de diálogo, burocracia e ausência de vontade política são apontadas como causas principais dessa exclusão.
A denúncia de Cássio também expõe o paradoxo: enquanto a comunidade é estigmatizada em discursos oficiais, é ao mesmo tempo reconhecida e valorizada por cidades vizinhas que não hesitam em contratar seus serviços.
“É inadmissível que agricultores indígenas sejam ignorados em sua própria cidade. A Prefeitura deveria ser a primeira a abrir as portas”, ressaltou o ex-secretário.
Silêncio do Executivo
Até o momento, nenhuma autoridade da gestão de Luísa Duarte se manifestou oficialmente sobre a exclusão da Fazenda Canto do PAA municipal ou sobre as falas do presidente da Câmara. A Secretaria de Agricultura, indicada por Madson Monteiro, também não respondeu aos questionamentos levantados publicamente.
O caso reacende o debate sobre políticas públicas para povos originários, a efetividade do discurso de inclusão e os entraves burocráticos que marginalizam quem mais precisa do Estado — mesmo quando já provam, na prática, sua capacidade de produzir, entregar e contribuir com a sociedade.