Análise: volta de Trump à presidência dos EUA pode garantir 'vitória à Rússia' no conflito ucraniano
Eleito o presidente dos Estados Unidos da América (EUA) este ano, a volta de Donald Trump à Casa Branca trará alguns desafios ao mundo contemporâneo.

Ouvidos pelo podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas avaliam impactos do magnata de volta ao poder.
O professor Rafael Pons Reis, do curso de bacharelado em relações internacionais do Centro Universitário Internacional Uninter conversou com o programa e compartilhou suas análises sobre o que podemos esperar do retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos em 2025.
Para o professor, o retorno de Trump ao poder pode trazer de volta sua abordagem isolacionista e pragmática na política externa.
O slogan "America First" deve continuar a guiar a atuação dos EUA, com um foco ainda maior na proteção dos interesses domésticos e um afastamento das instituições internacionais. Isso poderia significar o enfraquecimento das organizações multilaterais e a revisão de acordos globais, como o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, do qual Trump já havia retirado os Estados Unidos no primeiro mandato.
"O slogan 'America First' deve continuar a guiar a atuação dos EUA, com um foco ainda maior na proteção dos interesses domésticos e um afastamento das instituições internacionais", assegurou.
Ao ser questionada sobre o que esperar dessa possível eleição, Layla Dawood, professora do Departamento de Relações Internacionais da UERJ e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da mesma universidade destacou que, em relação às relações internacionais, a principal dúvida gira em torno da mudança ou não da "grande estratégia" dos Estados Unidos, ou seja, como mudaria a presença dos EUA em várias áreas, especialmente a presença militar.
"A presença militar dos Estados Unidos e sua interferência nos conflitos globais, como os que estamos vendo atualmente, será um ponto crucial", afirmou. Ela também se referiu ao espectro da política externa americana, que vai de uma postura mais contida, chamada "restraint", até uma postura mais intervencionista, a "primazia".
Sul global
Quanto ao Sul Global, que depende fortemente de acordos multilaterais e da cooperação internacional, o professor acredita que a volta de Trump poderia agravar ainda mais a situação.
"A retração dos EUA das plataformas internacionais, como ocorreu com a Organização Mundial da Saúde durante a pandemia de Covid-19, tende a dificultar as negociações globais, impactando negativamente os países do Sul Global", afirmou. No entanto, ele também indicou que esse vácuo deixado pelos Estados Unidos poderia criar oportunidades para outras potências, como China e Brasil. "Esse vácuo de poder pode ser preenchido por blocos como os BRICS, especialmente com a liderança do novo Banco de Desenvolvimento, que está sendo assumido por Dilma Rousseff, e com a estratégia da Iniciativa Cinturão e Rota da China", embasou.
No entanto, essa lacuna deixada pelos Estados Unidos poderia criar oportunidades para outras potências, como China e Brasil, especialmente dentro do contexto dos BRICS.
OTAN e conflito
Um ponto crucial levantado pelo professor foi o impacto nas relações dos EUA com a OTAN. Trump já havia criticado a aliança no seu primeiro mandato, pressionando os países europeus a aumentarem seus gastos com defesa.
"Trump já havia criticado a aliança no seu primeiro mandato, pressionando os países europeus a aumentarem seus gastos com defesa", lembrou Pons Reis. O professor prevê que, em 2025, Trump continuará a adotar essa postura e pressionará a Europa a assumir maior responsabilidade por sua própria segurança, enfraquecendo ainda mais a OTAN. "Eu acredito que ele vai continuar nessa linha de deixar a Europa para resolver seus próprios problemas, e a OTAN pode acabar sendo marginalizada", disse.
Essa estratégia pode ter implicações para o conflito na Ucrânia.
"Se Trump seguir essa linha, ele pode reduzir o apoio dos EUA ao conflito, favorecendo um acordo que beneficie a Rússia", disse o professor, apontando que Trump poderia pressionar Zelensky a aceitar um acordo que, do ponto de vista estratégico, seria mais vantajoso para a Rússia.
"Se esse cenário se materializar, podemos ver Putin como um vencedor, com a Ucrânia cedendo algumas regiões para a Rússia, o que é um objetivo estratégico do Kremlin", afirmou.
Dawood explicou que, se Trump se mantiver em sua postura de "restraint", pode-se esperar uma "autocontenção" dos Estados Unidos, como já sinalizado por ele em relação ao conflito na Síria, onde ele afirmou que os EUA não interviriam.
Por outro lado, em relação à situação na Ucrânia, a professora mencionou que Trump prometeu "terminar a guerra em um dia", o que poderia resultar numa redução da ajuda militar e financeira dos EUA à Ucrânia.
Ela ponderou, no entanto, sobre as possíveis consequências disso: "Essa diminuição da ajuda ocidental poderia ser vista como uma forma de apaziguamento, o que colocaria a Ucrânia em uma situação de fraqueza frente à Rússia", afirmou, acrescentando que, ao enfraquecer a Ucrânia, a Rússia poderia avançar em sua estratégia de anexar mais territórios, o que tornaria muito difícil uma negociação de paz.
Oriente Médio
Em relação ao Oriente Médio, o apoio de Trump a Israel e seu estreito relacionamento com Benjamin Netanyahu foram destacados pelo professor.
"Trump sempre foi pró-Israel, e acredito que ele continuará a apoiar Netanyahu, mesmo que isso dificulte a criação de um Estado Palestino, que considero uma utopia", comentou.
Sobre o conflito em Gaza, o professor acredita que Trump pode tentar pressionar por um cessar-fogo, mas reconhece que um acordo duradouro será difícil de alcançar. "A pressão por um cessar-fogo será intensa, mas as condições ainda são muito difíceis para uma paz verdadeira e sustentável. A fragilidade da Palestina e a situação do Hamas tornam esse cenário desafiador", explicou.
Por Sputinik Brasil