Amazônia Azul: é preciso mudar pensamento social de que o Brasil não tem ameaças, diz historiadora
Em entrevista ao podcast Jabuticaba sem Caroço, especialistas destacam que a Amazônia Azul é uma região rica em recursos naturais cobiçados por estrangeiros
No dia 16 de novembro é celebrado o Dia Nacional da Amazônia Azul, área oceânica que abrange 5,7 milhões de quilômetros quadrados, segundo levantamento da Marinha do Brasil.
A região é Zona Econômica Exclusiva (ZEE) do Brasil, o que significa que a exploração dessa área extremamente rica em recursos naturais e minerais é exclusivamente brasileira. Mais de 95% do comércio exterior brasileiro passa pelas rotas dessa região, que é responsável pela produção de 97% do petróleo nacional e 80% do gás natural.
Em entrevista ao podcast Jabuticaba sem Caroço, da Sputnik Brasil, especialistas destacam a importância da Amazônia Azul na área ambiental, política, estratégica e econômica.
Jéssica Gonzaga, professora de história naval e pós-doutoranda em estudos marítimos, explica que o conceito da Amazônia Azul foi criado pelo almirante Roberto Guimarães em uma análise feita "para ressaltar a importância estratégica e econômica do mar em relação à Amazônia verde".
"É sabido que a Amazônia verde tem uma riqueza natural extraordinária, de interesse internacional, e no mar não é diferente, então essa é a origem do conceito de Amazônia Azul", afirma, acrescentando que há uma alta demanda internacional pelos recursos da região.
Ela enfatiza que a preservação da Amazônia Azul é uma questão de soberania nacional pela importância econômica da região, uma vez que "o Brasil é um país altamente dependente do mar para sua sobrevivência", com 95% do comércio exterior do país passando por via marítima.
"Então imagina ter essas comunicações marítimas bloqueadas, a nossa economia e a nossa sociedade provavelmente mal iriam sobreviver. Até porque os outros 5% são as bacias hidrográficas, que também dependem do mar. Além disso, [há] a exploração de petróleo, a indústria da pesca, o transporte de pessoas, o turismo brasileiro, a extração de petróleo e gás, explotação e exploração de outros recursos. Tem um elemento que poucas pessoas conhecem, que são as algas calcárias, que hoje já têm influência na indústria do cosmético, para a alimentação do gado. Então, a Amazônia Azul é repleta de elementos vitais para o desenvolvimento econômico."
Gonzaga acrescenta que outro elemento a ser levado em conta é a localização da Amazônia Azul em uma área estratégica do Atlântico Sul, frisando que é necessário "mudar o pensamento social brasileiro de que o Brasil não tem ameaças". Ela lembra que no entorno que corresponde ao Atlântico Sul, à América do Sul, à África Ocidental, à Antártica, há problemas que podem acabar esbarrando na Amazônia Azul.
"O primeiro elemento é o Golfo da Guiné, lá na África Ocidental, onde nós temos pirataria, terrorismo. Se isso, por exemplo, vier para a Amazônia Azul, pode ser uma ameaça à nossa integridade. Então, sem sombra de dúvida, a Amazônia Azul deve ser defendida porque é uma condição para a defesa da soberania brasileira."
Submarino nuclear é crucial para a defesa da Amazônia Azul
Gonzaga afirma que a Marinha precisa estar bem "preparada, modernizada e capacitada" para a defesa da Amazônia Azul, e nesse contexto o Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub) é essencial.
"Temos nesse momento já incorporados [por meio do Prosub] o submarino Riachuelo, o submarino Humaitá, [o submarino] Tonelero, e agora nós estamos nos preparando para receber finalmente o submarino de propulsão nuclear, o submarino Almirante Álvaro Alberto. Tínhamos o submarino Angostura, que agora com o falecimento do almirante Karam, provavelmente vai ser rebatizado."
Sobre o submarino nuclear ela ressalta que não será um submarino de lançamento de mísseis, uma vez que o Brasil é signatário do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares.
"Mas qual é a importância de termos um submarino com propulsão nuclear? Isso vai nos dar mobilidade e capacidade dissuasória, nós estaremos entre os cinco países detentores dessa tecnologia [seis com o Brasil]. Então para um país que tem que defender um território do tamanho da Amazônia Azul, isso aí é imprescindível."
Amazônia Azul como fonte de energia renovável
Leticia Cotrim, professora da Faculdade de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pesquisadora da Rede Brasileira de Pesquisa em Acidificação do Oceano, da Rede Clima e da Rede de Pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisa Oceânica (INPO), destaca que a Amazônia Azul é rica em petróleo e gás e que o pré-sal está dentro dessa área. Porém, argumenta que é necessário "pensar para o futuro e não pensar no passado, já que óleo e gás são combustíveis fósseis e é o que vem produzindo a mudança climática".
"Seria muito mais moderno pensar, muito mais avançado, muito mais ousado, interessante para o país, até para se posicionar como liderança no combate à crise climática, o Brasil pensar na Amazônia Azul como uma fonte de energia renovável, com, por exemplo, a utilização da energia das marés, que vão e vêm todos os dias em diferentes regiões da costa, energia das ondas, energia de correntes, outras fontes de energia renováveis. Usar parte dessa extensão também para energia eólica", afirma.
Cotrim pontua que a inclusão da Amazônia Azul no mapa nacional não significa apenas passar um limite traçado no papel, trazendo a necessidade de estratégias de conservação, de preservação, de restauração de alguns desses ecossistemas costeiros e marinhos.
"Então, vem bastante trabalho por aí junto com isso. Outra questão é monitorar a pesca, monitorar a pesca e também justamente fazer um uso sustentável dos recursos pesqueiros, tudo isso são deveres de casa, e, obviamente, quanto maior essa zona econômica exclusiva, mais trabalhos vamos ter."
Por Sputinik Brasil