Pesquisadores implantam pela primeira vez coração totalmente artificial em paciente nos EUA
Um coração totalmente artificial feito de titânio foi implantado pela primeira vez com sucesso em um paciente nos Estados Unidos na semana passada. Chamado de Coração Artificial Total (TAH, da sigla em inglês), o aparelho é da BiVACOR, uma empresa de dispositivos médicos em fase de pesquisa clínica, e o procedimento foi realizado com médicos e pesquisadores do Instituto do Coração do Texas (THI). Tanto a empresa quanto o instituto divulgaram que a cirurgia para implantação do TAH foi um sucesso.
O implante faz parte da primeira pesquisa com o dispositivo em humanos para o estudo de viabilidade inicial apresentado à Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora equivalente à Anvisa nos Estados Unidos. Segundo comunicado do instituto em que o procedimento foi realizado, outras quatro implantações do TAH serão feitas e inscritas nessa pesquisa.
Por enquanto, o dispositivo não deve ser utilizado permanentemente como um substituto do coração. A ideia, na verdade, é que ele seja usado por pessoas que precisam de um transplante de coração enquanto esperam um órgão compatível. Foi o que acontece com o paciente a receber o dispositivo. Ele fez o implante no dia 9 de julho, ficou oito dias com o aparelho e, no dia 17, conseguiu um órgão doado e passou pelo transplante.
Como funciona
O Coração Artificial Total é uma bomba de sangue feita de titânio que funciona como uma centrífuga. Segundo Fabio Gomes, cardiologista e coordenador de práticas médicas do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, isso significa que o dispositivo faz rotações como uma hélice e impulsiona o sangue para frente, em vez de bombeá-lo.
"Ele tem um modo que é um fluxo com pulsatilidade, ou seja, ele acelera e desacelera e vai gerando ondas de pulso, que é o melhor jeito de entregar sangue também, sem passar pelo bombeamento", comenta. Mesmo sendo um dispositivo pequeno, o TAH pode fornecer fluxo sanguíneo suficiente para um homem adulto que pratica exercícios físicos, segundo o instituto texano.
Para isso, o aparelho utiliza tecnologia magnética, a mesma usada em trens de alta velocidade. No TAH, o rotor, estrutura que impulsiona o sangue, fica suspenso em um campo magnético, sem encostar nas paredes do dispositivo. Por isso, ele sofre menos com desgaste que outros.
"Se você tiver uma frequência cardíaca de 70 batimentos por minuto, então 70 vezes vai ter que bater aquele coraçãozinho por minuto. Ao longo do dia, dos anos, a durabilidade é muito comprometida. Então, a ideia do BiVACOR é trazer algo que vai rotacionar sem atrito", explica o cardiologista.
Com o fluxo de sangue gerado, ele substitui os dois ventrículos, diferente das outras opções de assistentes ventriculares que existem e cobrem apenas um dos lados do coração.
"Ele vai tanto imitar a saída do ventrículo esquerdo para a (artéria) aorta, que é o sangue que vai pro corpo todo, quanto do ventrículo direito para a (artéria) pulmonar, que vai pro pulmão", afirma Gomes.
Em comunicado, o Instituto do Coração do Texas afirma que o dispositivo é feito para homens e mulheres com insuficiência cardíaca biventricular grave ou em casos de insuficiência cardíaca univentricular em que o suporte do dispositivo de assistência ventricular esquerda não é recomendado. "Geralmente, é um paciente grave, que tem uma insuficiência cardíaca, que está num choque cardiogênico", explica Gomes.
Segundo o cardiologista, existem três tipos diferentes de indicação de uso dos dispositivos de assistência ventricular. A primeira é como ponte de transplante, objetivo do TAH, em que a implantação de um aparelho é feita para que o paciente consiga esperar uma doação de órgão.
A segunda é chamada de ponte para decisão. "Eu não sei se esse paciente vai precisar ou não de um transplante, mas ele está muito grave e eu preciso que ele fique vivo, que os órgãos recebam sangue adequadamente", explica o cardiologista. Em alguns casos, a doença do paciente é tratada, o coração se recupera e ele fica livre do transplante.
Já a terceira indicação é de uso como ponte para alta. Isso significa que a pessoa precisa do transplante, mas provavelmente não conseguirá por ter um tipo sanguíneo ou outras incompatibilidades muito relevantes. "Então ele vai de alta com o dispositivo", diz Gomes. Já existem algumas opções disponíveis, mas o problema é a durabilidade dos aparelhos - o que parece ser resolvido pela nova tecnologia do Coração Artificial Total da BiVACOR.
De acordo com o médico do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, isso seria fantástico. "Num mundo de escassez de órgãos, você teria a possibilidade de devolver esses pacientes para casa sem precisar do transplante", opina.
Segundo Gomes, os órgãos para transplantes são mais escassos em outros países, como os Estados Unidos, do que no Brasil. Ainda assim, existem 407 pessoas aguardando um transplante de coração no País, de acordo com a lista atualizada do Ministério da Saúde.