DINHEIRO PÚBLICO, FESTA PRIVADA

Ministério Público entra em campo contra patrocínio da prefeitura de Maceió ao São João da OAB

Por Redação Tribuna do Sertão com Folha de Alagoas Publicado em 29/12/2025 às 18:33

O Ministério Público de Alagoas decidiu puxar a rede e expor aquilo que classificou como um uso indevido de dinheiro público travestido de incentivo cultural. Em uma Ação Civil Pública contundente, o MP questiona o repasse de R$ 400 mil feito pela Prefeitura de Maceió para financiar o São João da OAB/AL, evento privado promovido pela entidade de classe dos advogados, durante a gestão do prefeito JHC.


A ação foi ajuizada pela 15ª Promotoria de Justiça da Capital, assinada pelos promotores Bruno de Souza Martins Batista e Fernanda Maria Moreira de Almeida, e tem como alvos diretos o Município de Maceió e a OAB Alagoas, presidida por Vagner Paes Cavalcanti Filho.


Na avaliação do Ministério Público, o patrocínio concedido ao evento representa mais do que um erro administrativo: configura uma violação frontal aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e transparência.


A “engenharia do peixe”: dinheiro público sem rede, sem anzol e sem critério


Segundo o MP, a chamada “engenharia do peixe” funcionou da seguinte forma: a Prefeitura criou uma lei municipal que abriu um verdadeiro atalho administrativo, permitindo a transferência de recursos públicos sem chamamento público, sem critérios objetivos e sem qualquer estudo técnico que justificasse a escolha da OAB como beneficiária.


Por isso, o Ministério Público pede a declaração incidental de inconstitucionalidade dos artigos 3º, 7º e 9º da Lei Municipal nº 7.370/23, norma que regulamenta os patrocínios no município de Maceió. Para os promotores, a lei institucionalizou a subjetividade e abriu espaço para favorecimentos direcionados, especialmente quando envolvem entidades com forte peso político e institucional.


Evento fechado, acesso restrito e conta aberta para o contribuinte


Outro ponto central da ação é a natureza do evento patrocinado. O São João da OAB não é uma festa pública, aberta e gratuita. Pelo contrário: trata-se de uma confraternização fechada, voltada prioritariamente a uma categoria profissional específica, com cobrança de ingressos e acesso restrito.
Para o Ministério Público, não há qualquer lógica administrativa ou interesse público que justifique o uso de recursos do Tesouro Municipal para bancar um evento privado, enquanto a própria Prefeitura de Maceió realiza, paralelamente, o São João oficial da cidade — este sim, público, gratuito e acessível à população em geral.


Convênio sob suspeita


Além de atacar a lei que permitiu o repasse, o MP pede também a nulidade do Termo de Convênio nº 024/2025, firmado entre a Prefeitura e a OAB/AL, que garantiu o pagamento dos R$ 400 mil. De acordo com a ação, o convênio foi celebrado sem planejamento público estruturado, sem alinhamento com a política cultural do município e sem demonstração concreta de benefício coletivo.


Mais que festa, um precedente perigoso


O caso extrapola a discussão sobre uma festa junina. O que está em jogo, segundo o Ministério Público, é um modelo de gestão que permite transformar dinheiro público em moeda de prestígio institucional, criando privilégios e abrindo precedentes perigosos para o uso seletivo do orçamento municipal.
Ao entrar com a ação, o MP manda um recado claro: recurso público não pode ser tratado como peixe para ser distribuído a portas fechadas. A rede precisa ser pública, o anzol transparente e o cardápio, necessariamente, voltado ao interesse coletivo.


Se a Justiça acolher os pedidos, o caso pode se tornar um divisor de águas na forma como patrocínios públicos vêm sendo concedidos em Maceió — e um alerta para outras prefeituras que confundem incentivo cultural com favorecimento institucional.