Helena despertou atordoada. Não sabia onde estava. Um frio devastador percorreu todo o seu corpo. Sua visão estava turva. Tudo muito claro e, ao mesmo tempo, escuro demais. Voltou a deitar-se, enquanto sentia seu corpo congelando aos poucos, como a cena épica de um navio que naufraga. Veio-lhe à memória a imagem de Paulo. Ainda não compreendia o que estava fazendo naquele lugar. Não aparecia ninguém para sanar suas dúvidas.
Sentou-se novamente. E a memória lhe foi retornando aos poucos… A voz exaltada de Paulo, a mão que lhe apertando o braço, o esmurro, o sangue quente escorrendo do seu rosto, como tantas lágrimas anteriormente derramadas. Viu-se no chão. E já não viu mais nada. Acordou desnorteada, sem compreender onde estava.
Aproveitando o tempo que tinha, sem que alguém viesse vê-la, começou a conversar com uma jovem que dormia ao seu lado. A jovem não lhe dava atenção, mas Helena já se acostumara a tagarelar sozinha, em casa, apenas sua gata Laninha ouvia sua voz a conversar pelos cantos.
Helena contou para a moça sobre um grande amor de sua infância: Paulo. Eles moravam a duas quadras do antigo colégio que frequentavam todos os dias; bastava dobrar a esquina e já se encontravam. Assim cresceram, até que a adolescência trouxe à tona algo a mais… Um sentimento bonito, porém cheio de contradições.
Helena trazia luz em seus olhos. Uma jovem doce e de uma educação eclesiástica. Cheia de sonhos, queria mudar o mundo. Bondosa, sã e feliz.
Apaixonada pelo menino Paulo, este que era inteligente, sociável, mas com uma personalidade volátil, pois mudava de comportamento como a velocidade das ondas com o passar das horas. Após vencerem a fase do amor ágape, Paulo começou a fazer pequenos pedidos que ressoavam como exigências. Mesmo assim, Helena acatava a todos.
Já não se vestia nem andava e sorria como antes… Aliás, já nem falava mais. Cultivava a esperança de que ele, certamente, mudaria. Não mudou. O relacionamento piorou. Mas o casamento chegaria em breve e tudo, tudo ficaria bem.
O casamento chegou cercado de boas promessas, regado por vinhos importados, presentes caros e uma cerimônia que valeria muito mais que o dote de Helena. Ela viveu seu sonho com todos os detalhes que imaginou a vida inteira. Estava tudo perfeito! até o momento em que saíram da cerimônia.
Já em casa, após as núpcias, viveu uma vida de prisioneira. Mal saía, sua área de convivência resumia-se aos metros quadrados que sua casa alcançava. Longos anos de submissão até que veio Marília. Meses de alegria. Até o fim da trégua de Paulo. Cada vez mais estressado, descarregava sua fúria em Helena, que já não suportava mais.
Então, resolveu traçar seu plano de fuga e aguardou a próxima viagem do marido. Tudo parecia dar certo até que…
Na manhã de sexta-feira, Paulo saiu para mais uma de suas viagens misteriosas e jamais comentadas em casa. Helena, rapidamente, pegou a bagagem embaixo da cama, aprontou Marília e ligou para sua mãe para anunciar a partida.
Quando se dirigia para a porta, foi surpreendida por Paulo, que havia deixado sua pequena mala sob o sofá. Diante da cena que presenciava, Paulo, enfurecido, avançou em Helena, ignorando a pequena Marília que, aos gritos, escondeu-se no quarto. Helena sentiu a fúria de Paulo em seu mais elevado nível. Apagou.
Agora, naquele misterioso local, o filme de sua vida passou lentamente. Quanta coisa teria sido diferente – pensava ela. Sentiu como se jogasse no mar seu bem mais precioso sob a promessa de uma utópica felicidade.
Sentou-se e avistou alguém vindo. Parecia Paulo, parecia um médico, já não parecia nada… Deitou-se novamente e adormeceu, sem saber onde estava.
Baixe o aplicativo de combate à violência doméstica pelo QRcode e peça ajuda.
Ou ligue 180.Não silencie. O silêncio pode custar a sua vida.
14 Comments
Neste híbrido de crônica e conto – estilo experimentado pelo magistral Graciliano Ramos desde a juventude -, Isabelle nos faz refletir sobre um problema que persiste, infelizmenente em nossa história: a violência contra a mulher. Parabéns à jovem escritora por fazer da palavra um instrumento estético e ético de conscientização! Uma bela estreia!!
Meu querido Confrade, como suas palavras aquecem meu coração! E ser comparada ao nosso mestre Graça é de uma honra tamanha que nem cabe em mim. Espero dar muito orgulho a nossa Academia e aos meus companheiros! Obrigada pelo belo retorno.
Parabéns pelo belo texto, extremamente atual em face da violência doméstica contra a mulher que milhares delas sofrem cotidianamente. Denunciar é uma atitude que salva vidas! Denunciemos!
Precisamos incentivar, ajudar e propor solução! Todas nós merecemos viver plenamente nossa liberdade. Sem ter nossa vida ceifada pela violência.
O primeiro sinal de violência de qualquer tipo a mulher já deve procurar ajuda. Parabéns Isabelle,
Isso!!
Precisamos mostrar a elas que é possível sair de uma situação de violência!
Parabéns, minha amiga, realmente um texto necessário!
Ah!!! Obrigada, Nanda!
Obrigada por sempre apoiar esses projetos! Um dia, vamos ver todas as mulheres livres de verdade!
Parabéns Isabelle , texto maravilhoso e pertinente .
Precisamos através de pensamentos e depois palavras falar , mostrando o cotidiano de mulheres que sofrem outras que brilham .
Parabéns Isabelle, maravilhoso texto que nos faz refletir o Dilema de várias mulheres nos tempos atuais .
Obrigada pelo retorno! Nossa missão é dar voz à essas mulheres!
Um fenômeno está nascendo, só basta a gente contemplar e fazer com que o mundo inteiro conheça ela, Isabelle Mendes, a progressão da humanidade. Que Deus te abençoe e lhe guie sempre!
Ah! Quanta gratidão lhe tenho, meu irmão!
Obrigada por todo carinho!
Olá tribunadosertao adorei seu conteúdo!
Você está passando por dificuldades no seu relacionamento? Este método ajudou milhares de mulheres a se tornarem sua melhor versão e construir um relacionamento de alto valor.
Acesse esse link e saiba como:
https://bit.ly/naomendigueafetoseame