Desde cedo, considero haver sido a vida generosa comigo, vez que me ofereceu a dádiva de percorrer milhares de recantos do mundo, pisar terras distantes, contemplar mares diversos, colecionar horizontes e aprender com cada paisagem, que a beleza se manifesta de muitas formas.

E viajando, aprendi facilmente que o dom da inspiração não chega em trombetas ou carruagens de fogo, ansiando por palco ou aplauso, ela se esconde no quase nada, em uma poça de lama ou pedregulho do Seridó, as vezes em uma folha caída, que não lamenta o chão, apenas aceita o repouso e ensina, em silêncio, que há beleza até no fim de um ciclo.

Ainda assim, entre tantas maravilhas vistas e paisagens admiradas, há um lugar que não se deixa comparar, a Barra de São Miguel, que aprendi já há mais de quarenta e cinco anos, a idolatrar, pois para mim ela não se mede, se impõe, seu azul não sussurra, afirma, suas praias, o rio Niquim e até a croa das conchas, não apenas refletem o céu, mas parecem guardá-lo para que jamais se perca.

Na Barra, o sol encontra repouso nas águas mansas, o vento aprende a ser brisa e o tempo, humilde, desacelera. Não é um cenário que se visita, é um sentimento que se reconhece.

E mais uma vez neste mês de janeiro, ela será o meu recanto de paz, lugar onde a alma encontra silêncio e o coração aprende a respirar com calma, oferecendo condições para recarregar as simbólicas baterias da alma, não apenas com o sal do mar e o calor do sol, mas, sobretudo, com a energia de seres de luz: minha família.

E então consciente, de que a inspiração mora onde ninguém procura, no comum que se revela extraordinário, aos olhos de quem aprendeu a parar, sentir e perceber, haverei de mais uma vez, perceber que o milagre não vive nos grandes acontecimentos, mas na delicadeza invisível das coisas corriqueiras.

Na Barra, vou descansar o corpo, fortalecer o espírito e agradecer à vida por me lembrar que, entre tantos caminhos percorridos, o verdadeiro destino, é sempre aquele onde o amor nos espera.